quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Tática para aumentar indicados transforma Oscar em terrenos para poucos

A lista de indicados ao Oscar 2014 pode ser a prova de que a tática da Academia, que há cinco temporadas aumentou o número de finalistas na categoria principal, pode ter falhado. A desculpa para aumentar as vagas em melhor filme de cinco para dez --e depois para "um número entre cinco e dez", segundo um cálculo maluco inventado pela produção-- era prestigiar uma crescente produção de qualidade, reconhecer filmes que não teriam chance de entrar numa seleção mais fechada e, de uma maneira geral, consagrar mais obras.

Na prática, a ideia era agradar os estúdios, fazer média com o cinema independente e deixar o Oscar mais antenado com o mercado. É bom lembrar que, um ano antes, dois filmes considerados favoritos a aparecer na lista de indicados ("Batman, o Cavaleiro das Trevas" e "Wall-E") foram excluídos, gerando uma revolta geral em Hollywood. O aumento do número de filmes finalistas era uma maneira de não pisar na bola de novo. Mas parece que o efeito foi o contrário, pelo menos neste ano.

Em 2014, apenas 12 filmes conseguiram emplacar indicações no chamado Top 8, as oito principais categorias do Oscar: filme, direção, os quatro quesitos de elenco e os dois de roteiro.  Estas categorias, juntas, representam um total de 40 a 45 indicações, dependendo do número de finalistas a melhor filme. As 44 vagas deste ano foram divididas entre apenas 12 produções. Em outros anos --na época das cinco indicações para melhor filme-- 16, 18, 20 ou até mais longas conseguiam representação no Top 8.

Voto condicionado
Como explicar esse fenômeno? Alguns especialistas acreditam que o problema está na elasticidade da categoria principal. Com o aumento no número de indicados, o eleitor da Academia estaria condicionado, acreditam eles, a enxergar esses filmes como os importantes do ano, aqueles que merecem ser votados. Para se ter uma ideia, dos 12 longas que entraram no Top 8, somente três não disputam o Oscar de melhor filme: "Blue Jasmine", "Álbum de Família" e "Antes da Meia-Noite".

Todos os outros indicados saíram dos nove filmes finalistas ao Oscar, inclusive atores que não estavam entre os favoritos a uma indicação, como Christian Bale, por "Trapaça", entre os atores, e Jonah Hill, por "O Lobo de Wall Street", entre os coadjuvantes. Ambos ficaram fora do Globo de Ouro e do prêmio do SAG, o Sindicato dos Atores, dois termômetros para o Oscar. Como seus longas eram candidatos em potencial para melhor filme, eles terminaram tendo mais sorte do que, respectivamente, Robert Redford, por "Até o Fim", e Daniel Brühl, de "Rush", filmes que já estavam de fora da disputa principal, segundo as premiações anteriores.

Amy Adams, também de "Trapaça", foi outra beneficiada pela nova lógica da Academia. Seu filme era forte candidato, mas a corrida das atrizes ficou apertada. Muita gente acreditava que Amy entraria na vaga de Meryl Streep, por "Álbum de Família", filme sem chances na categoria mais importante.

O prestígio da dama de Hollywood, no entanto, fez com que ela conseguisse sua 18ª indicação, deixando com que Amy derrubasse outra veterana: Emma Thompson, já dada como certa entre as atrizes, mas que terminou sem a vaga já que "Walt nos Bastidores de Mary Poppins" ficou minúsculo na campanha até sobrar apenas uma indicação pela trilha sonora.

A lógica de que os filmes "votáveis" são os candidatos a filme do ano também teria garantido uma inesperada indicação em montagem para "Clube de Compras Dallas", em detrimento de filmes mais técnicos --e mais comuns neste quesito-- como novamente "Rush", que passou em branco no Oscar deste ano. O filme de Ron Howard não chegou ao fim da corrida com a força de "Blue Jasmine", que mesmo sem indicação a melhor filme elegeu Cate Blanchett, que ainda puxou a "irmã" Sally Hawkins, ou de "Antes da Meia-Noite", que contou com o efeito "fim de trilogia" e manteve intactas suas chances em roteiro adaptado.

O que deveria preocupar a Academia é que a estratégia para aumentar o número de filmes prestigiados pelo Oscar parece ir por água abaixo. Caso a lógica do "melhor filme" permaneça no ano que vem, corre-se um sério risco de se transformar o Oscar num terreno ainda mais restrito, onde méritos individuais são subtraídos em decorrência do conjunto. Uma reforma parece necessária --e rápido-- inclusive porque ter nove filmes concorrendo a um prêmio não parece coisa muito séria.

Por Chico Fireman, no site UOL Entretenimento, em 26/02/2014.

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